A infância é a época mais injusta da vida,
hoje estou quase chegando aos quarenta e posso dizer isso sem medo de errar. É
a época em que não se tem contas a pagar, onde o tempo passa a passos lentos, quando
uma singela moeda significa muito dinheiro, os sonhos se confundem com a
realidade e os avós são eternos, sempre estarão lá para transformar os sonhos
em realidade e encantar os netos com histórias e brincadeiras.
Tive muita sorte durante esse período, além
dos 4 avós (maternos e paternos) ainda fui presenteada com uma bisavó. Não tive
do que reclamar, naquela época, anos 80, era normal ter pais casados e
presentes, ter avós maternos e paternos, vários tios e uma bisavó. Todos
tiveram um papel na minha infância, mas o que falar de vovó Amélia?
Foi ela quem curtiu as netas (eu e minha
irmã) de uma maneira invejável, tanto ia nos visitar, de quando em vez, como
fazia questão de curtir nossas férias como se fossem as dela. Eu ainda não
tinha capacidade de entender o quanto minha vó significava para as outras pessoas
ou para a sociedade, afinal uma “senhora” que se divorciou de um doutor em
meados dos anos 70, e foi para a escola junto com os filhos, poderia ser taxada
de doida ou de revolucionária. Para mim ela era minha vó e só isso bastava.
Dos sonhos transformados em realidade e dos
momentos de “corujice voterna” as festas juninas, os aniversários e natais eram
um espetáculo a parte. O que dizer de uma avó cuja bagagem estava repleta de
biscoitos de Conquista e a cabeça repleta de ideias para encantar adultos e
crianças? Lembro de uma vez que fui fantasiada de palhaço e provavelmente devo
ter morrido de vergonha, lembro-me de uma mesa de aniversário (não lembro se
era o meu ou o de minha irmã) cheia de tartarugas, feitas com pães ou algo
assim; em outro momento tinha um bolo com cobertura de chocolate e várias
frutas em miniatura, feitas com leite em pó nas mais diversas formas e cores.
Infelizmente a memória não me deixa lembrar os detalhes, exceto a parte antes
das festas que era uma festa a parte. Além de fazer o brigadeiro, e raspar a
panela, ainda tínhamos a expectativa de raspar o tacho de qualquer coisa doce;
poderia ser uma cocada, a cobertura ou até mesmo a massa crua do bolo.
O tempo passou e os avós se foram, as contas
surgiram, as obrigações, os horários a cumprir, o trabalho a fazer, a tão
sonhada “independência”, independente da minha vontade. Na memória ficaram as
poucas lembranças de um tempo passado que não retorna, mas a certeza de uma
infância repleta de aventuras e recordações de vovó Amélia.
(Texto de Mariana para a segunda edição do livro de Amelinha)
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